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segunda-feira, 22 de abril de 2013

ENTRE A CIÊNCIA E A RELIIÃO


Não apenas na matemática revelou-se o gênio precoce de Pascal. Nas demais ciências ele realizou surpreendentes progressos e aos dezenove anos inventou a máquina aritmética, que permitia que se fizesse nenhuma operação sem lápis nem papel, sem que se soubesse qualquer regra de aritmética, mas com segurança infalível. O invento de Pascal foi considerado uma verdadeira revolução, pois transformava uma máquina em ciência, ciência que reside inteiramente no espírito. A construção da máquina, foi, todavia, muito complicada e Pascal levou dois anos trabalhando com os artesãos. Essa fadiga comprometeu definitivamente sua saúde, que se tornou muito frágil daí por diante.

Aos 23 anos, tomou conhecimento da experiência de Torricelli (1608-1647) referente à pressão atmosférica e realizou outra, denominada "a experiência do vácuo", provando que os efeitos comumente atribuídos ao vácuo eram, na verdade, resultantes do peso do ar. Mais tarde ­ a partir de 1652 -, passou a se interessar pelos problemas matemáticos relacionados aos jogos de dados. As pesquisas que fez a esse respeito conduziram-no à formulação do cálculo das probabilidades. O chamado Triângulo de Pascal foi um dos resultados dessas pesquisas sobre jogos de azar: trata-se de uma tabela numérica que, entre outras propriedades, permite calcular as combinações possíveis de m objetos agrupados n a n.

Um dos últimos trabalhos científicos de Pascal nesse período é o Tratado Sobre as Potências Numéricas, em que aborda a questão dos "infinitamente pequenos". A essa questão voltará mais uma vez em 1658, num derradeiro estudo científico sobre a área de ciclóide, curva descrita por um ponto da circunferência que rola sem deslizar sobre uma reta. O método aplicado por Pascal para estabelecer essa área abriu caminho à descoberta, do cálculo integral, realizada por Leibniz (1646-1716) e Newton (1642-1727).

Em Ruão, para onde se havia mudado a família Pascal, Blaise conheceu Jacques Forton, senhor de Saint-Ange-Montcard, com quem teve as primeiras discussões a respeito da Bíblia, dos dogmas e da Igreja católica e da teologia em geral. Blaise e outros jovens, seus amigos, logo consideraram Saint-Ange-Montcard um herético pernicioso. Começa então a fase apologética da obra de Pascal, quando ele se une aos jansenistas do Port-Royal, sob a influência de sua irmã, Jacqueline Pascal, que havia entrado para o convento. Segundo o relato de Gilberte, Jacqueline conseguiu persuadir o irmão de que "a salvação devia ser preferível a todas as coisas e que era um erro atentar para um bem passageiro do corpo quando se tratava do bem eterno da alma". Pascal tinha então trinta anos, quando "resolveu desistir dos compromissos sociais. Começou mudando de bairro e, para melhor romper com seus hábitos, foi morar no campo, onde tanto fez para abandonar o mundo que o mundo afinal o abandonou".

Assim, depois do período em que procurou a verdade científica e a glória humana no domínio da natureza e da razão, Pascal dirigiu seu interesse para as questões da Igreja e da Revelação, acalentando o projeto de reunir a sociedade laica e a cristã e de combater a corrupção que teria sido causada pela evolução dos últimos séculos. Nesse período escreve o Memorial, obra mística, e os trabalhos de cunho apologético Colóquios com o Senhor de Saci Sobre Epicteto e Montaigne e as Províncias.
Na verdade, Pascal foi decisivamente marcado por um acontecimento, que determinou a mudança de sua trajetória espiritual: o "milagre do Santo Espinho". O fato é narrado pela irmã de Pascal, Gilberte Périer: "Foi por esse tempo que aprouve a Deus curar minha filha de uma fístula lacrimal que a afligia havia três anos e meio. Essa fístula era maligna e os maiores cirurgiões de Paris consideravam incurável; e enfim Deus permitiu que ela se curasse tocando o Santo Espinho que existe em Port-Royal, e esse milagre foi atestado por vários cirurgiões e médicos, e reconhecido pelo juízo solene da Igreja". A cura de sua sobrinha e afilhada repercuriu profundamente em Pascal: "... ele ficou emocionado com o milagre porque nele Deus era gloorificado e porque ocorria num tempo em que a fé da maioria era medíocre. A alegria que experimentou foi tão grande que se sentiu completamente penetrado por ela, e, como seu espírito ocupava-se de tudo com muita reflexão, esse milagre foi a ocasião para que nele se produzissem muitos pensamentos importantes sobre milagres em geral".

As análises sobre o milagre são fundamentais no pensamento de Pascal, pois determinam o centro de todas as suas reflexões religiosas e filosóficas: a figura de Cristo, mediador entre o finito (as criaturas) e o infinito (Deus criador). Em função de Cristo, Pascal estabelece a verdadeira relação entre os dois Testamentos: o Antigo revelaria a justiça de Deus, perante a qual todos os homens seriam culpados pela transmissão do pecado original; o Novo revelaria a misericórdia de Deus, que o leva a descer entre os homens por intermédio de seu Filho, cujo sacrifício infunde a graça santificante no coração dos homens e os redime. A idéia central de Pascal sobre o problema religioso é, portanto, a de que sem Cristo o homem está no vício e na miséria; com Cristo, está na felicidade, na virtude e na luz.

A figura de Cristo permite ainda a Pascal distinguir os pagãos, os judeus e os cristãos: os pagãos (isto é, os filósofos) seriam aqueles que acreditam num Deus que é si simplesmente o autor das verdade geométricas e da ordem dos elementos; os judeus seriam os que acreditam num Deus que exerce sua providência sobre a vida e os bens dos homens a fim de dar-lhes um sequencia de anos felizes; já os cristãos seriam os que creem num Deus de amor e de consolação, que faz com que eles sintam interiormente a miséria em que vivem e a infinita misericórdia de quem os criou. Somente aquele que chega ao fundo da miséria e da indignidade e que sabe do mediador (Cristo), chegando por intermédio dele conhecer o verdadeiro Deus, pois só o mediador poderia reparar a miséria do homem.

http://www.mundodosfilosofos.com.br/pascal.htm

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