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4 - PASCAL CIENTISTA


Blaise Pascal (1623 - 1662) foi exceção em sua época, enquanto a maioria filosofava sobre os conceitos de Descartes, ele soube separar a ciência da religião. Viveu a ciência sem deixar que ela fosse sua vida. Sua filosofia está relacionada com a condição humana. Desde cedo dedicou-se ao estudo da ciência, mas foi na teologia que ele encontrou a seu verdadeiro modo de abordar as questões de natureza teológicas e epistemológica, tendo já no final da sua curta vida deixado aquilo que seria um tratado inacabado, que mais tarde foi publicado sob o título de “Pensamento”, que muitos consideram um obra com caráter apologético.






TRAGETÓRIA DE PASCAL NAS CIÊNCIAS.

Blaise Pascal foi um aristocrata de família de magistrados. O pai, um interessado pelas ciências matemáticas, com a viuvez decidiu consagrar-se à educação do filho. Extraordinário filósofo, físico, escritor e matemático francês nascido em Clermont-Ferrand, Auvergne, que como filósofo e místico criou uma das afirmações mais pronunciadas pela humanidade nos séculos posteriores, “O coração tem razões que a própria razão desconhece”, síntese de sua doutrina filosófica: o raciocínio lógico e a emoção.

Filho de um professor de matemática, Etienne Pascal, foi educado sobre forte influência religiosa tornou-se extremamente ascético, escrevendo várias obras religiosas. Seu talento precoce para as ciências físicas e o estudo da matemática, recebia em sua casa os principais estudiosos da época. O jovem Blaise Pascal teve, assim, excelente escola. Segundo sua irmã Gilberte, aos doze anos ele formulava, sem recorrer a livros, as primeiras proposições da geometria euclidiana. Aos dezesseis, escreveu um tratado sobre secções cônicas que causou espanto a Descartes. E, aos dezoito, inventou a primeira máquina de calcular.

Acompanhou o pai quando este foi transferido para a cidade de Ruão, onde haviam excelentes fabricantes de vidro, e lá realizou as primeiras pesquisas no campo da física, onde também reproduziu o trabalho de Torricelli. Desempenhou experiências sobre sons que resultaram em um pequeno tratado (1634) e no ano seguinte chegou a dedução de 32 proposições de geometria estabelecidas por Euclides. Publicou Essay pour les coniques (1640), contendo o célebre teorema de Pascal. Excelente matemático especializou-se em cálculos infinitesimais e criou um tipo de máquina de somar que chamou de La pascaline (1642), a primeira calculadora manual que se conhece, conservada no Conservatório de Artes e Medidas de Paris, e inventada para auxiliar o pai que passara a ser encarregado do controle fiscal na Normandia.

Seu pai morreria no início da década seguinte (1951). De volta a Paris (1647), influenciado pelas experiências de Torricelli, enunciou os primeiros trabalhos sobre o vácuo e demonstrou as variações da pressão atmosférica. A partir de então, desenvolveu extensivas pesquisas utilizando sifões, seringas, foles e tubos de vários tamanhos e formas e com líquidos como água, mercúrio, óleo, vinho, ar, etc, no vácuo e sob pressão atmosférica.

Aperfeiçoou o barômetro de Torricelli e, na matemática, publicou o célebre Traité du triangle arithmétique (1654). Juntamente com Pierre de Fermat, estabeleceu as bases da teoria das probabilidades e da análise combinatória (1654), que o holandês Huygens ampliou posteriormente (1657).

Neste mesmo ano após uma “visão divina”, abandonou as ciências para se dedicar exclusivamente a teologia, e no ano seguinte recolheu-se à abadia de Port-Royal des Champs, centro do jansenismo, só voltando às ciências após “novo milagre” (1658). Neste período publicou seus principais livros filosófico-religiosos: Les Provinciales (1656-1657), conjunto de 18 cartas escritas para defender o jansenista Antoine Arnauld, oponente dos jesuítas que estava em julgamento pelos teólogos de Paris, e Pensées (1670), um tratado sobre a espiritualidade, em que fez a defesa do cristianismo e marcou o início de seu afastamento dos jansenistas, facção católica inspirada em Santo Agostinho.

Como teólogo e escritor destacarau-se como um dos mestres do racionalismo e irracionalismo modernos e sua obra influenciou os ingleses Charles e John Wesley, fundadores da Igreja Metodista. Um dos seus tratados sobre hidrostática, Traité de l’équilibre des liqueurs, só foi publicado postumamente (1663), um ano após sua morte, em Paris. Esclareceu finalmente os princípios barométricos, da prensa hidráulica e da transmissibilidade de pressões. Estabeleceu o princípio de Pascal que diz: “em um líquido em repouso ou equilíbrio as variações de pressão transmitem-se igualmente e sem perdas para todos os pontos da massa líquida. É o princípio de funcionamento do macaco hidráulico. Na Mecânica é homenageado com a unidade de tensão mecânica ou pressão Pascal: 1Pa = 1 N/m², 105N/m² = 1 bar)”.

O jovem cientista tomava contato com o problema que preocupava os estudiosos de seu tempo. Nos anos que se seguiram dedicou-se exclusivamente à questão.

O “horror ao vácuo” não era uma explicação que satisfizesse Pascal. Ele acreditava que a razão deveria estar com os que atribuíam o fenômeno estu­dado por Torricelli à pressão atmosfé­rica. Mas não se contentava com intuições ou afirmações sem fundamento. Queria estabelecer suas objeções aos aristotélicos em bases inatacáveis.

O primeiro passo do cientista foi demonstrar que no alto do tubo de Torricelli não havia ar rarefeito, uma das crenças mais difundidas na ocasião. Repetiu a experiência barométrica usando tubos das mais variadas formas e de diâmetros diferentes. Em todos os casos a altura da coluna de mercúrio perma­necia a mesma. Se houvesse ar rarefeito nos tubos ela deveria variar. Mas isso não acontece e, portanto, a hipótese do ar rarefeito é inexata.

No Tratado do Equilíbrio dos Líquidos, Pascal afirma que “os líquidos pesam conforme a sua altura”, a pressão que exercem na base do recipiente que os contém não depende da forma e do volume deste. Por isso, a pressão feita pelos líquidos dos recipientes ao lado, ou dos vasos comunicantes, acima, são equivalentes, pois, nos dois casos, a altura e a área da base são iguais.

Uma outra hipótese de Pierius, sustentava que o mercúrio emite vapo­res que preenchem o alto do tubo. Pas­cal refutou essa tese com uma expe­riência mais espetacular que a primeira. Usou tubos de cristal de 12 metros de comprimento, presos a um mastro de navio e com um mecanismo de contra­pesos que lhe permitia virá-los depois, de cheios. Novamente repetiu a experiência de Torricelli com água num dos tubos e vinho no outro. Como o vinho é mais volátil, teria que equilibrar-se num nível mais baixo que o da água, se a hipótese de Pierius fosse correta. Ocorreu justa­mente o contrário. Mais uma vez Pascal triunfava. No entanto, evitava confir­mar a existência do vácuo. Apenas refu­tara falsas interpretações. Faltava a prova definitiva.

Enquanto isso, o mundo da ciência se agitava. Diversas experiências, algu­mas até grotescas, eram realizadas para provar que havia vácuo no alto do tubo de Torricelli. O padre Mersenne utilizou pássaros, moscas e outros insetos, tentando demonstrar que não sobre­viveriam à falta de ar no interior do tubo. Chegou a sugerir a construção de um barômetro especial, no qual seria colocado um homem munido de um martelo para quebrar o vidro em caso de perigo. As experiências tiveram re­sultados contraditórios: um pássaro morreu asfixiado, mas uma mosca apa­rentemente morta saiu voando ao ser retirada do tubo. Os malogros deviam-se à má qualidade do material empre­gado e à inexperiência dos cientistas.

Pascal, por sua vez, envolvia-se em polemicas com o padre jesuíta Étienne Noel, que defendia a tese aristotélica sobre a impossibilidade de existir vácuo. Nessa discussão por meio de cartas, começou a estabelecer as bases do que viria a ser o método expe­rimental na Física, corrigindo e am­pliando o sistema cartesiano, excessiva­mente dogmático.

Para Descartes, um raciocínio bem conduzido é suficiente para se chegar ao conhecimento perfei­to: a ciência matemática é a chave do Universo. Já Pascal acreditava que a realidade extravasa em todos os senti­dos as possíveis fragilidades da razão: é necessário interrogar sempre a nature­za; a experiência, aliada ao raciocínio, é o que permite chegar à compreensão dos fenômenos físicos. Mais tarde, e em outro contexto, chegaria a estabelecer uma distinção entre o espírito geomé­trico, que é o da ciência matemática, sustentado pela demonstração racional e o espírito de finura (fïnesse), da vida e da arte, mas que é também o espírito que leva à persuasão (onde a demonstração não cabe) e que, por outro lado, comanda a própria aplica­ção prática dos conhecimentos abstratos. 

Antes de se lançar ao trabalho que demonstraria a existência da pressão atmosférica. Pascal procurou generalizar o problema estudado. Será que o peso do ar além de manter em equilí­brio a coluna de mercúrio no tubo de Torricelli, não poderia ser a causa de outros fenômenos conhecidos? Com esse objetivo, ele passou a examinar uma série de outros casos até então explicados pelo “horror da natureza ao vácuo”. O próprio Pascal descreve algu­mas dessas observações: “Um fole com todas as aberturas fechadas é difícil de ser aberto. Se ten­tarmos fazê-lo sentiremos uma resistência como se estivesse colado; quando procuramos retirar o pistão de uma seringa fechada, ele resistirá como se estivesse preso ao fundo”.

Pascal sentiu que se encontrava ante uma força até então desconhecida, que não se evidenciava apenas na expe­riência de Torricelli, mas que aparen­tava ter efeitos mais gerais. Fiel a seus princípios, o cientista só se pronunciará a respeito após uma comprovação defi­nitiva.

A PROVA DECISIVA

“Eu imaginei uma prova que se for corretamente executada por si só seria suficiente para esclarecer aquilo que procuramos.” É esse o início da carta escrita por Pascal a seu cunhado Florin Perrier, em Clermont Ferrand, pedindo-lhe que organizasse a experiência numa montanha próxima à cidade, o Puy de Dome. Na carta tudo está expli­cado, previsto e descrito com uma pre­cisão verdadeiramente genial: “Trata-se de fazer a já conhecida experiência do vácuo, inúmeras vezes num mesmo dia, usando o mesmo recipiente e o mesmo mercúrio, tanto na planície como no alto de uma  monta­nha, para verificar se a altura do mercú­rio em suspensão no tubo é igual ou diferente nas duas situações. Como você pode ver, a experiência é decisiva. Se a altura da coluna de mercúrio for menor no alto da montanha (tenho uma série de razões para acreditar que seja) se concluirá necessariamente que o peso do ar é a única causa do fenómeno e não o horror ao vácuo. É  lógico que o peso do ar no pé da montanha é maior do que no alto, a não ser que se diga que a natureza abomina mais o vácuo na planície”.

As dificuldades para a realização da experiência não faltavam e Pascal as reconhecia:
“É necessário escolher uma monta­nha extremamente alta, perto de uma cidade, na qual se encontre uma pessoa capaz de dar a essa prova toda a exatidão que ela requer. Se a montanha esti­ver distante, será difícil transportar a cuba, os tubos e o mercúrio…”

Mas as dificuldades foram superadas. O Puy de Dôme, próximo a Clermont Ferrand, era facilmente acessível, sendo o local ideal para a observação. Florin Perrier,  que ali vivia. Era pessoa de confiança e já colaborara com Pascal em experiências anteriores.

Com a experiência de Puy de Dome, Pascal, na época com 25 anos, pode provar que a pressão do ar diminui quando aumenta a altitude, à medida que se sobe a colina.

A carta foi enviada em novembro de 1647, mas Perrier foi obrigado a viajar, devido à sua função de Conselheiro de Corte, e somente a 19 de Setembro do ano seguinte pode realizar a experiên­cia. Para surpresa dos incrédulos, as previsões de Pascal foram confirmadas: “a diferença entre os níveis indicados, simultaneamente, pelos dois barômetros de Torricelli, um na planície e outro no alto do Puy de Dôme passava de 8 centímetros. Desta forma, a existência da pressão atmosférica deixava de ser uma hipótese para tornar-se um fato demonstrado experimentalmente. Em outubro, o próprio Pascal repetiria a prova na torre de Saint Jacques, em Paris”

Apenas quatro anos decorreram desde a experiência de Torricelli até a de Pascal. No entanto, nesse curto espaço de tempo, graças ao novo método, o de procurar a explicação para os fenômenos naturais na própria natureza, a Ciência progrediu enormemente.

Da experiência no Puy de Domê Pascal tirou algumas consequências marcantes. Concluiu, por exemplo, que com o uso do barômetro de mercúrio “é possível saber se dois lugares distam igualmente do centro da Terra, ou qual o mais alto e qual o mais baixo”. Pela primeira vez era formulado o princípio da determinação de altitudes por nivela­mento barométrico.

Apesar de sua curta existência, este brilhante cientista francês reuniu em sua personalidade duas características aparentemente antagônicas: “o espírito geométrico, que o fez importante físico e matemático e o espírito literário uma vez que, sendo grande escritor, é considerado o verdadeiro fundador da prosa literária francesa”.

Fonte: http://oscientistas.wordpress.com/kit-os-cientistas/pascal-e-torricelli/  e capítulo 6, p. 101-116 de Os Cientistas, São Paulo: Abril Cultural, 1974.








5 comentários:

Arlindo Nascimento Rocha disse...

Blaise Pascal apresenta uma obra científica inacabada. Pascal se limitou a apontar caminhos novos, que imediatamente abandonava. Ele poderia ter sido uma figura de maior destaque na história da matemática e da física.
Após a sua conversão, Pascal passou a dedicar-se mais às reflexões filosóficas e teológicas. Suas obras nessa área (Pensamentos e as Provinciais) são temas de debate nas academias e congregações religiosas até hoje.
Pascal em sua filosofia não quis opor a razão ao coração, e sim integrar ambos. E acreditava também ser a religião a única a dar respostas às questões colocadas pela condição humana.

Arlindo Nascimento Rocha disse...

Blaise Pascal inventou a calculadora mecânica em 1642. Ele concebeu-o ao tentar ajudar o seu pai que tinha sido atribuída a tarefa de reorganizar as receitas fiscais da província francesa de Haute-Normandie ; primeiro chamado Máquina Aritmética , de Pascal calculadora e mais tarde Pascaline , poderia somar e subtrair directamente e multiplicar e dividir pela repetição.
Pascal passou por 50 protótipos antes de apresentar sua primeira máquina para o público em 1645. Ele dedicou a Pierre Séguier , chanceler da França na época. Ele construiu cerca de vinte máquinas mais durante a próxima década, muitas vezes melhorando o seu design original. Nove máquinas têm sobrevivido ao longo dos séculos, sendo a maioria delas em exposição em museus europeus. Em 1649 um privilégio real , assinada por Luís XIV da França , deu-lhe a exclusividade do design e fabricação de máquinas de calcular na França.
Sua introdução iniciou o desenvolvimento de calculadoras mecânicas na Europa primeiro e depois em todo o mundo, o desenvolvimento que culminou, três séculos mais tarde, pela invenção do microprocessador desenvolvido para uma Busicom calculadora em 1971.
A indústria calculadora mecânica deve muito de suas máquinas e invenções-chave para a Pascaline. Primeira Gottfried Leibniz inventou sua rodas Leibniz após 1671 ao tentar adicionar uma multiplicação automática e recurso de divisão para o pascalina, , em seguida, Thomas de Colmar chamou sua inspiração de Pascal e Leibniz quando projetou suaArithmometer em 1820 e, finalmente, Dorr E. sentiu as rodas substituídas entrada do pascalina por colunas de chaves para inventar seu Comptometer em torno de 1887. O pascalina também foi constantemente melhorado, especialmente com as máquinas do Dr. Roth por volta de 1840, e depois com algumas máquinas portáteis até a criação do primeiras calculadoras electrónicas.
http://en.wikipedia.org/wiki/Pascal's_calculator

Arlindo Nascimento Rocha disse...

PASCAL E A FÍSICA.

O interesse em física foi despertado pelas experiências de Evangelista Torricelli em 1644, e por sete anos ele conduziu uma série de experimentos para testar e finalmente refutar a visão aceita que a natureza abomina o vácuo. Tradicionalistas acreditavam nisto pela autoridade de Aristóteles, mas Pascal tinha cabeça aberta suficiente para testar o axioma e chegar a inesperadas conclusões. Os resultados são embaçados nos papéis sobre pressão barométrica e a pressão hidráulica.
Não menos significativo que estes resultados, é o conjunto de experiências organizadas em 1648 para medir a pressão barométrica simultaneamente em diferentes altitudes. Tubos de vidro de vários tamanhos foram fabricados, alturas ao longo das montanhas de Puy-de-Dôme em volta de Clermont cuidadosamente medidas, condições climáticas anotadas e leituras dos instrumentos verificadas duas vezes. Tudo isso é uma utilização do método experimental. Contra críticas, Pascal defendeu que as evidências de dados experimentais tem mais autoridade nas ciências naturais do que o peso das tradições. O prefácio do inacabado Treatise on the Vacuum (1651) fala disso convincentemente e faz comparação com o respeito servil das suas críticas aos Jesuítas pela tradição na ciência com as inovações deles em teologia, um assunto corretamente dependente da autoridade da revelação, das Escrituras e dos Padres.

Leonardo Francisco disse...

Excelente material. Obrigado.

Leonardo Francisco disse...
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