A grandeza do homem é
grande por ele conhecer-se miserável; uma árvore não se conhece miserável. É
então ser miserável conhecer (-se) miserável, mas é ser grande conhecer que se
é miserável [PASCAL, 2005, p. 40]
Arlindo Nascimento Rocha[1]
Influenciado pela cultura pós-moderna, a maioria dos
homens tende a cumprir a maldição do homem atualizado para definir a ilusão de
que, quanto mais perto estamos da informação global, mais perto estaremos da
sabedoria, e, consequentemente, mais felizes seremos. Esta miopia é parcela da
nossa atual cultura, ou seja, do último homem interpretado como uma ‘paródia’
da tirania do bem-estar físico, típico da nossa época. O comum dos homens está
convencido da sua dignidade, o semissábio denuncia sua fragilidade, mas, o
sábio descobre que a sua verdadeira dignidade reside no pensamento, que não
deveria referir unicamente à dimensão epistemológica, uma vez que, é
imprescindível a dimensão ética em que a dignidade humana deveria manifestar-se
através do reconhecimento da sua grandeza miserável. Entretanto, o grande
problema, é que a maior parte dos homens comporta-se contrariamente a essa
advertência e buscam o conhecimento e a felicidade onde não podem encontrá-los,
uma vez que, a maioria das pistas a serem percorridas, são como circuitos
fechados, redondos ou elípticos, não levam a lugar nenhum, e servem apenas para
correr em círculos, assevera Morin.
Contemporâneo de Descartes, Blaise Pascal vive uma época
que procura enaltecer as potencialidades humanas e principalmente a existência
racional do homem. Sendo a razão aquilo que nos distingue, somente o seu uso
autônomo e integral, pode ser o caminho para a realização humana. Embora Pascal
tenha vivido no contexto histórico do século XVII, cuja característica mais
forte, foi o racionalismo cartesiano, distingue-se profundamente, nos
princípios e nas consequências do estilo de pensamento que marcou de maneira
decisiva os rumos da Filosofia Moderna.
No horizonte da sua Apologia está o
conhecimento de Deus e do homem, mais precisamente, a tentativa de compreender
a natureza humana através de sua procedência divina e a tentativa de
compreender algo de Deus por via de sua imagem impressa no coração do homem.
Daí, a existência contraditória representada pela nobreza da criatura divina e
na abjeção, por ter renegado a Deus. Por isso, a salvação do homem depende de
uma graça misteriosa absolutamente gratuita. Portanto, existe em nós, uma
grandeza que deriva da nossa origem divina e do destino que a criatura deve
cumprir, retornando ao seu criador, e, uma miséria, proveniente do pecado
original, pelo qual a criatura preferiu a afirmação da sua sabedoria, à
harmonia que deveria caracterizar a relação do homem e Deus.
Esta obra é uma versão modificada da minha dissertação de
mestrado: Paradoxos da condição humana: grandeza e miséria como paradoxo
fundamental em Blaise Pascal, apresentada ao Programa de Ciência da Religião da
Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), em 2016, sob a
orientação do professor Doutor Luiz Felipe de Cerqueira e Silva Pondé. Nossa
pesquisa encontra-se intimamente ligada à Filosofia da Religião, e retomamos o
estudo do pensamento pascaliano com a pretensão de ampliar a discussão e a
reflexão sobre a natureza humana, que é certamente, um dos aspetos que mais
inquietou nosso filósofo. Por isso, nosso objetivo principal foi o de analisar
a concepção paradoxal da natureza humana, presente na filosofia de Blaise
Pascal, em sua dimensão existencial, como ser essencialmente contraditório,
onde enfatizamos a relação entre ‘grandeza e miséria’, como paradoxo
fundamental, cujo centro da reflexão é o homem decaído e investigar a ideia de
uma individualidade do homem que reconhece sua própria identidade. Nossa
análise foi temática, com o enfoque histórico, antropológico, epistemológico e
psicológico.
A obra está dividida em cinco capítulos, onde analisamos
inicialmente o contexto histórico da França do século XVI; os precursores do
conceito de natureza humana; a visão antropológica do homem pascaliano antes e
depois do pecado original; os limites do conhecimento racional, que são
colocados pela condição da própria finitude humana e das múltiplas
insuficiências; e, por último, lançamos o olhar sobre a epistemologia e a
psicologia pascalianas, que guardam uma relação estreita com sua antropologia,
e, enfatizamos conceitos como: imaginação, tédio e divertimento como marcas da
insuficiência humana.
Espero que esta obra seja do proveito
de todos os pascalianos, amantes, estudiosos ou não de sua obra, pois, esta
será mais uma contribuição que nos ajudará na árdua tarefa de levar a
todos um pouco mais sobre Pascal e o seu legado. Que o mesmo possa servir de
instrumento de conhecimento, pesquisa e reflexão, pelos que se interessam por
questões relativamente à condição humana e levam a sério tudo o que diz
respeito ao homem – criatura em busca de si mesmo e em evolução continua
através da ciência, da filosofia, da teologia e de todas as outras ciências
cujo objeto principal é o homem.
“O erro hereditário de todos os filósofos é basear-se no
homem de uma época particular e depois transformar isso numa verdade eterna”.
Friedrich Nietzsche
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Referência
Referência
ROCHA, Arlindo Nascimento. Paradoxos da condição humana: grandeza e miséria como paradoxo
fundamental em Blaise Pascal. 1ª ed. – Maringá: Viseu, 2019, p. 15 a 17.
[1] Autor da obra PARADOXOS DA CONDIÇÃO
HUMANA, uma adaptação da dissertação de Mestrado apresentado na PUC-SP sob a
orientação do Dr. Luiz Felipe Pondé em 2016.
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