Não
apenas na matemática revelou-se o gênio precoce de Pascal. Nas demais ciências ele
realizou surpreendentes progressos e aos dezenove anos inventou a máquina
aritmética, que permitia que se fizesse nenhuma operação sem lápis nem papel,
sem que se soubesse qualquer regra de aritmética, mas com segurança infalível.
O invento de Pascal foi considerado uma verdadeira revolução, pois transformava
uma máquina em ciência, ciência que reside inteiramente no espírito. A construção
da máquina, foi, todavia, muito complicada e Pascal levou dois anos trabalhando
com os artesãos. Essa fadiga comprometeu definitivamente sua saúde, que se
tornou muito frágil daí por diante.
Aos
23 anos, tomou conhecimento da experiência de Torricelli (1608-1647) referente
à pressão atmosférica e realizou outra, denominada "a experiência do
vácuo", provando que os efeitos comumente atribuídos ao vácuo eram, na
verdade, resultantes do peso do ar. Mais tarde a partir de 1652 -, passou a se
interessar pelos problemas matemáticos relacionados aos jogos de dados. As
pesquisas que fez a esse respeito conduziram-no à formulação do cálculo das
probabilidades. O chamado Triângulo de Pascal foi um dos resultados dessas
pesquisas sobre jogos de azar: trata-se de uma tabela numérica que, entre
outras propriedades, permite calcular as combinações possíveis de m objetos
agrupados n a n.
Um
dos últimos trabalhos científicos de Pascal nesse período é o Tratado
Sobre as Potências Numéricas, em que aborda a questão dos "infinitamente
pequenos". A essa questão voltará mais uma vez em 1658, num derradeiro
estudo científico sobre a área de ciclóide, curva descrita por um ponto da
circunferência que rola sem deslizar sobre uma reta. O método aplicado por
Pascal para estabelecer essa área abriu caminho à descoberta, do cálculo
integral, realizada por Leibniz (1646-1716) e
Newton (1642-1727).
Em
Ruão, para onde se havia mudado a família Pascal, Blaise conheceu Jacques
Forton, senhor de Saint-Ange-Montcard, com quem teve as primeiras discussões a
respeito da Bíblia, dos dogmas e da Igreja católica e da teologia em geral.
Blaise e outros jovens, seus amigos, logo consideraram Saint-Ange-Montcard um
herético pernicioso. Começa então a fase apologética da obra de Pascal, quando
ele se une aos jansenistas do Port-Royal, sob a influência de sua irmã,
Jacqueline Pascal, que havia entrado para o convento. Segundo o relato de Gilberte,
Jacqueline conseguiu persuadir o irmão de que "a salvação devia ser
preferível a todas as coisas e que era um erro atentar para um bem passageiro
do corpo quando se tratava do bem eterno da alma". Pascal tinha então
trinta anos, quando "resolveu desistir dos compromissos sociais. Começou
mudando de bairro e, para melhor romper com seus hábitos, foi morar no campo,
onde tanto fez para abandonar o mundo que o mundo afinal o abandonou".
Assim,
depois do período em que procurou a verdade científica e a glória humana no
domínio da natureza e da razão, Pascal dirigiu seu interesse para as questões
da Igreja e da Revelação, acalentando o projeto de reunir a sociedade laica e a
cristã e de combater a corrupção que teria sido causada pela evolução dos
últimos séculos. Nesse período escreve o Memorial, obra mística, e os
trabalhos de cunho apologético Colóquios com o Senhor de Saci Sobre
Epicteto e Montaigne e as Províncias.
Na
verdade, Pascal foi decisivamente marcado por um acontecimento, que determinou
a mudança de sua trajetória espiritual: o "milagre do Santo Espinho".
O fato é narrado pela irmã de Pascal, Gilberte Périer: "Foi por esse tempo
que aprouve a Deus curar minha filha de uma fístula lacrimal que a afligia
havia três anos e meio. Essa fístula era maligna e os maiores cirurgiões de
Paris consideravam incurável; e enfim Deus permitiu que ela se curasse tocando
o Santo Espinho que existe em Port-Royal, e esse milagre foi atestado por
vários cirurgiões e médicos, e reconhecido pelo juízo solene da Igreja". A
cura de sua sobrinha e afilhada repercuriu profundamente em Pascal: "...
ele ficou emocionado com o milagre porque nele Deus era gloorificado e porque
ocorria num tempo em que a fé da maioria era medíocre. A alegria que experimentou
foi tão grande que se sentiu completamente penetrado por ela, e, como seu
espírito ocupava-se de tudo com muita reflexão, esse milagre foi a ocasião para
que nele se produzissem muitos pensamentos importantes sobre milagres em
geral".
As
análises sobre o milagre são fundamentais no pensamento de Pascal, pois
determinam o centro de todas as suas reflexões religiosas e filosóficas: a
figura de Cristo, mediador entre o finito (as criaturas) e o infinito (Deus
criador). Em função de Cristo, Pascal estabelece a verdadeira relação
entre os dois Testamentos: o Antigo revelaria a justiça de Deus, perante a qual
todos os homens seriam culpados pela transmissão do pecado original; o Novo
revelaria a misericórdia de Deus, que o leva a descer entre os homens por intermédio
de seu Filho, cujo sacrifício infunde a graça santificante no coração dos
homens e os redime. A idéia central de Pascal sobre o problema religioso é,
portanto, a de que sem Cristo o homem está no vício e na miséria; com Cristo,
está na felicidade, na virtude e na luz.
A
figura de Cristo permite ainda a Pascal distinguir os pagãos, os judeus e os
cristãos: os pagãos (isto é, os filósofos) seriam aqueles que acreditam num
Deus que é si simplesmente o autor das verdade geométricas e da ordem dos
elementos; os judeus seriam os que acreditam num Deus que exerce sua
providência sobre a vida e os bens dos homens a fim de dar-lhes um sequencia de
anos felizes; já os cristãos seriam os que creem num Deus de amor e de
consolação, que faz com que eles sintam interiormente a miséria em que vivem e
a infinita misericórdia de quem os criou. Somente aquele que chega ao fundo da
miséria e da indignidade e que sabe do mediador (Cristo), chegando por
intermédio dele conhecer o verdadeiro Deus, pois só o mediador poderia reparar
a miséria do homem.
http://www.mundodosfilosofos.com.br/pascal.htm
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