A
figura de Blaise Pascal (1623-1662), matemático, filósofo moralista e teólogo francês,
importante representante moderno do cristianismo, sempre provocou em Friedrich
Wilhelm Nietzsche (1844-1900), influente filósofo alemão do século
XIX, uma dupla reação. Abundam na obra de Nietzsche referências respeitosas ao
“gênio” de Pascal enquanto filósofo, porém, Nietzsche não hesita em criticar Pascal,
quando o assunto gira em torno da moral e da religião cristã.
Pascal
viveu numa época em que a fé cristã tinha como pano de fundo o racionalismo e o
ceticismo, o que representava para Nietzsche o expoente religioso da negação metafísica
do mundo. Na obra Aurora (1881), Nietzsche
critica explicitamente a moral cristã, e Pascal aparece como um exemplo mórbido
de como um intelecto brilhante se deixou seduzir pela visão cristã do mundo. Tal
lamento nietzschiano encontra a sua expressão mais clara na passagem de Além do
Bem e do Mal (1886), em que descreve a “fé de Pascal” como um “contínuo
suicídio da razão” e um “sacrifício do intelecto”.
Paradoxalmente,
em Ecce Homo (1888), Nietzsche reúne na mesma afirmação admiração e crítica, ao
declarar “amar” Pascal como “a mais instrutiva vítima do cristianismo, lentamente
assassinado”. Como se vê, Pascal é encarado por Nietzsche de uma forma ambivalente.
Tanto
Pascal quanto Nietzsche são mestres da expressão concentrada e fragmentária.
Pascal o declara na célebre passagem dos Pensées, 373 intitulada Pirronismo:
“Escreverei aqui meus pensamentos sem ordem, não em uma confusão sem objetivo:
esta é a verdadeira ordem...” Nietzsche, é o grande mestre alemão do aforismo. Ambos
possuem em comum várias posições
filosóficas, como:
1)
o combate ao otimismo superficial e ao racionalismo de sua época.
2)
uma certa concepção – diferente mas às vezes coincidente – do ceticismo.
3)
a eleição do “perspectivismo” como forma necessária do conhecimento humano
e
da formação de valores.
Pascal
e Nietzsche compartilham uma insatisfação essencial com relação à condição
humana atual. Porém, ambos buscam um ideal de perfeição superior à existência
meramente biológica. Então o cristianismo trágico de Pascal e a filosofia trágica
e anticristã de Nietzsche mantêm algo mais do que uma mera relação de exclusão
recíproca.
É
interessante observar que, tanto um com outro ganham importância, para a
filosofia moderna e contemporânea, quando confrontados com a questão da moderna
da crise religiosa: o “pessimismo” do “eu odioso” pascaliano e a “crítica” do “niilismo”
em Nietzsche se encontram na visão de um homem “estranho a si mesmo” presente
nas interrogações contemporâneas sobre a essência do homem.
Estudar
Pascal e Nietzsche é muito mais do que apresentar um conflito entre ateísmo e
cristianismo, é talvez, tentar mostrar que o ateísmo de Nietzsche pode incluir
uma relação ambivalente com aquele que foi criticado por Voltaire.
A partir do artigo de José
Thomaz Brum professor do Curso de Especialização em História da Arte da (PUC-RIO). http://www.fflch.usp.br/df/gen/pdf/cn_08_02.pdf
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