Pesquisar neste blogue

Translate/Traduzir

quinta-feira, 15 de setembro de 2016

Pascal: como reconhecer a unidade complexa na obra pascaliana?

Data de Nascimento:19 de junho de 1623 em Clermont (agora Clermont-Ferrand), Auvergne, França 
Morreu em: 19 de agosto de 1662 em Paris, França
De acordo co Edgar Morim (1921), em seu livro Os Meus Filósofos, Blaise Pascal é o maior pensador, o mais próximo (ao mesmo tempo que Heráclito). Pascal é para ele as verdades mais fulgurantes que surgem bruscamente no fluxo descontínuo dos “Pensamentos”, e, afirma que o fato dessa obra não ter sido acabada aumenta sua grandiosidade. 

Segundo ele, algumas obras são grandiosas porque não formam terminadas. No caso dos “Pensamentos” de Blaise Pascal, sua forma aforística confere-lhes uma violência singular, como se vê em Nietzsche. De Acordo com Morim, se os “Pensamentos” tivesse sido concluídos, empobreceria a própria obra, uma vez que teria adquirido uma forma racionalizadora. O que definiu a originalidade dos Pensamentos, foi a morte prematura de seu autor. Morim afirma:

Li Pascal muito cedo e hoje compreende o que me pascalizava e me pascaliza para sempre: é o laço extraordinário e complementar entre a fé, a razão, a dúvida; combate, complementaridade que sempre foram os meus. (MORIM, 2014, p. 53)   
 
Certa ocasião, Morim foi convidado a proferir uma sessão de abertura na Universidade Blaise Pascal em Clermont-Ferrand, ele ficou surpreso, pois, constatou que, Pascal havia sido dividido em fragmentos separados uns dos outros: Pascal Polêmico, Pascal Jansenista, Pascal estudioso, Pascal escritor.

De acordo com Bem Roger (2001, p, 11), como polêmico, “Pascal é lido como o autor da obra-prima cartas Provinciais, um violento ataque a corrupta teologia e moral relaxada dos jesuítas e seus aliados na Igreja Católica.” Quanto ao Pascal jansenista, segundo Rossi (2004, p. 120), “é óbvio que não se pode falar de uma verdadeira conversão de Pascal ao jansenismo, mas de forte e crescente interesse por essa doutrina, vista por ele como freio salutar ao pensamento libertino e as ilusões de uma razão sempre menos instrumento e sempre mais fim e escopo indevido do homem”. Entretanto, essa tese de Rossi, parece não ser a mesma de outros estudiosos de Pascal. Jacques Attali defende que a conversão aconteceu duas ou três vezes na vida de Pascal.

Pascal conheceu o evangelho por influência do jansenismo: um movimento dentro da igreja, fundado pelo bispo holandês Cornelius Jansen (1585–1638), que preconizava uma reforma católica com base na igreja primitiva e uma espiritualidade interior. O que muitos designam como a primeira conversão, data de uma altura que o pai de Pascal sofreu um acidente. Dois jovens médicos afetos ao jansenismo que cuidaram dele, introduziram na família pascal, as ideias defendidas pelos jansenistas, vinculadas principalmente a Antoine Arbauld e Sint Cyrram. Neste sentido, podemos afirmar que, a principal influência sobre o pensamento religioso de Pascal veio do jansenismo, um movimento católico francês que enfatizava a experiência religiosa pessoal e especialmente a conversão súbita como capaz de colocar a alma em relação direta com Deus. Pascal foi tocado o que lhe levou a converter ao jansenismo tendo arrastado toda a família com ele. 
    
Já a segunda conversão aconteceu em uma data precisa (23 de novembro de 1654, numa segunda-feira à noite, “das dez e meia da noite, mais ou menos, até cerca de meia-noite e meia”) e em um lugar determinado (em seu quarto, enquanto lia a sós a oração sacerdotal de Jesus, em João 17). Na mesma ocasião, ele registrou essa experiência em um pedaço de pergaminho. Como esse escrito estava costurado no forro do seu casaco, quando morreu, oito anos depois, supõe-se que Pascal o tenha carregado na roupa o tempo todo.

Pascal é classificado como “gênio” precoce, uma vez que, desde cedo demonstrou uma inteligência que o colocava em um lugar distinto das outras crianças da sua idade. Ele foi um gênio precoce da geometria e da física, aos 12 anos publicou seu primeiro ensaio sobre o som, aos 14 já frequentava o círculo dos eruditos, aos 16 escreveu o Ensaio sobre as Cônicas, aos 19 concebe a máquina de calcular. Entre outras obras, destacamos os Pensamentos, publicados após a sua morte. Mas a unidade de Pascal, segundo Morim, permanece mal conhecida, sem dúvida porque, em si mesma, inclui a presença de componentes aparentemente antagônicos.

Em lugar de enxergar a fé, a dúvida, a razão e a religião como instâncias inimigas e mutuamente exclusivas, identificou nelas elementos conflituosos, mas também complementares de sua própria tragédia interior. Em Pascal a oposição entre a ordem absurda da fé e da ordem empírico-racional da ciência acompanha-se de uma complementaridade dialógica de uma e de outra.

Fé, dúvida, razão, religião se encontram, se entrecombatem e se alimentam uma da outra. A grandiosidade de Pascal é ter tornado seu enfrentamento complementar e fecundo. Essas características deveriam ter permitido reconhecer melhor a unidade complexa da obra pascaliana. Em lugar disso, o que se tem sobre essa obra são visões parciais e separadas uma da outra. 
        
Referências
ROSSI, Roberto. Introdução à Filosofia: histórias e sistemas. - 2ª Ed. Edições Loyola, São Paulo, Brasil, 2004.
ROOGERS, Bem. Pascal: elogio do efêmero. Tradução de Luiz Felipe Pondé. – São Paulo : Editora UNESP, 2001.- (Coleção grandes filósofos).
MORIM, Edgar. Meus filósofos. - 2ª edição. Traduzido por Edgard de Assis Carvalho e Mariza Perassi Bosco.- Porto Alegre: Sulina, 2014.

Sem comentários: