Como “futuro” Cientista da Religião, talvez não
faria essa relação tangencial entre a Religião e a morte. Consigo sim, mesmo
ainda que preso a algumas amarras da minha formação intelectual ver uma certa
ligação entre ambos, mas, ciente de que são duas esferas da condição paradoxal
da natureza humana. O homem é um ser essencialmente paradoxal, naturalmente insuficiente
e contingente. Sua grandeza e sua miséria são dimensões de uma existência efêmera,
povoado de acontecimentos que pela sua incapacidade de abarcar tudo, flerta com
teorias sobre a vida, a morte, vida após a morte, reencarnação, ressurreição, religião, alma, Deus...
Será que o homem na sua dimensão existencial
concreta necessita de tudo isso? Nossa vida e a vida dos nossos amigos serão
melhores se conseguirmos responder todas as questões candentes sobre a nossa
real situação? Precisamos ser religiosos para tornar mais sublime nossas
reflexões sobre a morte? Ou, precisamos acreditar que a vida após a morte é em
último caso, a possibilidade de realizar tudo o que essa vida passageira não
nos possibilitou realizar?
Acredito que, desde os primórdios da humanidade o
homem sempre questionou sobre a sua existência e o seu perecimento, e, nessa
tentativa desesperada, era preciso encontrar respostas que apaziguasse suas
dúvidas. Porém, ainda hoje, continuamos fazendo as mesmas perguntas e tendo as mesmas
dúvidas. Ser religioso realmente é uma garantia que após essa passagem terrena
estaremos aptos para uma segunda chance? Nesse caso, pela pluralidade de religiões,
qual seria e eleita de Deus que garantisse efetivamente, que nossas ações
enquanto homens comuns teriam a eternidade como recompensa?
Face a esses questionamentos, prefiro pensar a
religião na dimensão existencial prática, como fenômeno social que molda o
comportamento de seres humanos pensantes, mas que não resolve o problema da
morte. Essa é a verdadeira marca da nossa miséria, quando nós nos deparamos com
a nossa pequenez e infinitude diante de um cosmo infinitamente grande, quando
comparado com a nossa existência mísera.
B. Pascal Filosofo francês do sec. XVII, num dos
seus famosos fragmentos questiona: Afinal que é o homem diante da natureza? Nada,
em relação ao infinito; tudo, em relação ao nada; um ponto intermediário
entre o tudo e o nada. Infinitamente incapaz de compreender os extremos, tanto
o fim das coisas quanto o seu princípio permanecem ocultos num segredo
impenetrável, e é-lhe igualmente impossível ver o nada de onde saiu e o
infinito que o envolve.
Mediante esse
fragmento podemos ver que o desespero do homem é tão grande, que torna um imperativo
fazer construtos cada vez mais elaborados na tentativa de escapar desse vazio
interior que o assombra. A morte talvez seja uma das maiores preocupações do
homem, porém, em minha opinião, não deveria ser, ou se fosse, seria para que o
homem pudesse viver melhor enquanto habitante desse cosmo.
Como nada está garantido ou dado, para o homem a
melhor solução, é nunca apostar contra o infinito, porque caso o fizer ele
perde sempre. As pessoas preferem confiar nos dogmas religiosos como mediador
entre a finitude humana e a infinitude de Deus. Fazendo isso, e de acordo com
Pascal, não se perde nada! E isso me faz mais uma vez lembrar de outro fragmento
de Pascal onde ele tenta convencer racionalmente um libertino (ateu) sobre a existência
de Deus. É o argumento da aposta. Segundo pascal, “se você acredita em Deus e
morre e Deus não existe, você não perdeu nada; se você acredita em Deus, você e
ele existe, você ganha a eternidade; mas, se você não acredita em Deus, você
morre, e Deus existe, você será condenado eternamente”.
Daí, ser preferível acreditar na sua existência porque
o homem não tem nada a perder. Seria legitimo fazer o mesmo com a religião? Bom,
pelo menos sobre as religiões sabemos algumas coisas! E sobre a morte? O que
sabemos? Nada! Só sabemos que ela é certa! E o que vem depois dela? Paraíso,
escuridão, caos, fogo eterno?! Como se diz no senso comum, nunca ninguém voltou
para dizer como foi!
Entretendo, ultimamente e com a facilidade de usar e
acessar as redes sociais, muito se tem falado e compartilhado “experiências científicas”
provando a existência da alma e a vida após a morte! Em primeiro lugar, é
preciso suspender o juízo e depois procurar saber as fontes de tais
informações, pois, nem tudo o que se partilha ou publica provém de fontes fidedignas.
Recuando um pouco, e falando um pouco mais sério, a
tradição filosófica como não poderia deixar de ser, também se preocupou com o
destino do homem após a morte. Hoje, embora essa reflexão esteja afastada do
centro das reflexões filosóficas, não deixou de ser uma preocupação do homem contemporâneo.
Embora, podemos constatar empiricamente que, uma boa parte dos homens atuais
estão mais preocupados com o aqui e agora! Será que eles estão errados? E se
não estiverem? Viver um dia de cada vez e usufruir o máximo de prazer, alegria
e felicidade seria o melhor caminho? Tenho minhas dúvidas! O vazio existencial que
muitas vezes me assombra me leva a constatar o contrário! Precisamos nos
angustiar antes, para que possamos valorizar momentos de felicidade! Também não
tenho uma resposta! Mas sei que preciso viver para poder morrer! A vida e a
morte são passagens para outras dimensões ou com a morte tudo acaba?! Bom, se
tudo acaba, é melhor aproveitar a vida! Mas se existe um propósito e uma nova
etapa após a morte, vala a pena levar uma vida mais austera e mais uma vez não
apostar contra o infinito! Infinito! Mas o que sabemos do infinito? Será que
morremos para poder viver ou vimemos para poder morrer!?
VIVAMOS TODOS PORQUE
UM DIA MORREREMOS TODOS!!!
Arlindo nascimento Rocha
E,
lembrando de Manuel Bandeira, não esqueçamos de dançar um tango argentino.
Pneumotórax
Febre,
hemoptise, dispnéia e suores noturnos.
A vida inteira que podia ter sido e que não foi.
Tosse, tosse, tosse.
Mandou chamar o médico:
- Diga trinta e três.
- Trinta e três... trinta e três... trinta e três...
- Respire.
-
O senhor tem uma escavação no pulmão esquerdo e o pulmão direito infiltrado.
- Então, doutor, não é possível tentar o pneumotórax?
- Não. A única coisa a fazer é tocar um tango argentino.